Segundo dia do CNMI abriu portas à Inteligência Artificial
O segundo dia do Congresso Nacional de Medicina Interna (CNMI), que decorre até domingo em Vilamoura, no Algarve, reservou espaço para temas de grande atualidade da Medicina e abriu a possibilidade de debate a todos os internistas. O avanço no campo da Inteligência Artificial foi um dos temas em destaque na reunião magna dos internistas.
Convidado para a conferência “Os extraordinários progressos na Inteligência Artificial e o seu impacto na Medicina”, o físico Armando Vieira, que tem dedicado a sua carreira ao tema, deu conta dos avanços que têm sido feitos nos últimos dez anos e deixou claro que este é um campo que pode ajudar na prática médica e no trabalho operacional dos hospitais.
Armando Vieira
“Houve uma grande evolução. As tecnologias não são novas, mas graças ao poder computacional o avanço no processamento dos algoritmos é notório e estes são hoje capazes de fazer o que até há poucos anos julgávamos impossível”, disse o especialista, que advogou que é necessário deixar de parte a oposição entre homens e máquinas e o medo de as máquinas substituírem os humanos.
“Temos antes que integrar, perceber qual é o problema, o que dificulta o acesso à saúde e o dia a dia dos médicos, e em cada uma dessas componentes definir no que é que a tecnologia pode ajudar. As máquinas não estão à altura de substituir as pessoas e a evolução passa por criar uma simbiose entre máquinas e humanos”, afirmou Armando Vieira, que disse ainda que a Medicina é a área ideal para testar os avanços desta tecnologia e a área onde o seu impacto poderá ser maior.
“Ainda não é visível nos hospitais, mas será apenas uma questão de tempo. É um processo lento mas inevitável”, terminou.
Novas especialidades: oportunidade ou ameaça?
Logo pela manhã, num debate que colocou frente a frente António Martins Baptista e Jorge Teixeira, os dois especialistas trocaram argumentos sobre a criação de novas especialidades. O primeiro defendeu que nem o sistema de saúde nem o doente ganham nada com a criação de mais especialidades.
“Na prática, o doente é melhor tratado por um internista desde o momento em que entra, até ao momento em que sai do hospital. A criação de mais especialidades vai apenas criar mais uma porta entre a urgência e o resto do hospital, algo que não é necessário”, disse o antigo presidente da SPMI.
António Martins Baptista, António Oliveira e Silva e Jorge Teixeira
Já Jorge Teixeira lembrou que o avanço da ciência obriga os médicos a caminhar no sentido da especialização.
“O conhecimento evolui e leva-nos a especializar. Esta especialização contribui para um melhor tratamento dos doentes e das suas doenças. Esta é também uma constatação da realidade, visto que as especialidades já apareceram há mais de 200 anos e esta evolução corresponde à marcha do tempo. O conhecimento vai aumentando e a capacidade do cérebro humano tem limites. Portanto, trata-se de especializar para melhor tratar os doentes”, resumiu.
O idoso frágil
Outro tema em destaque no segundo dia do CNMI foi o tratamento do doente idoso e das suas especificidades. Numa sessão multidisciplinar, Sofia Duque abordou o tema da síndrome de fragilidade e revelou que o seu tratamento é o cerne da intervenção da medicina geriátrica, mas que ainda está no domínio teórico e tem pouca tradução na prática clínica.
“Tem-se vindo a colecionar dados no sentido de atrasar ou até mesmo reverter a fragilidade, em particular a deterioração funcional, mas é difícil encontrar conclusões taxativas. No entanto, alguma intervenções podem ter grande importância na redução da fragilidade, como por exemplo o exercício físico, as intervenções nutricionais, a suplementação com vitamina D ou a revisão da polimedicação. A maior eficácia consegue-se com a junção de todas estas intervenções, numa abordagem global e multifatorial”, defendeu a médica.
Rafaela Veríssimo, Heidi Gruner, Lia Marques, Eduardo Haghighi, Sofia Duque e Lèlita Santos
Já Rafaela Veríssimo debruçou-se sobre a temática da diabetes no idoso e afirmou que, cada vez mais, o modo como se olha para o doente diabético tem de ser adaptado, quer às morbilidades quer ao estado funcional do doente.
“Cerca de 80% dos doentes que estão nas nossas enfermarias são idosos e, portanto, o entendimento e o tratamento desse doente é peculiar e devem ser identificadas”, justificou.
Fígado gordo, necessidade de uma abordagem multidisciplinar
Em mais uma das sessões do 25.º CNMI, Jorge Leitão foi um dos oradores de uma sessão dedicada à abordagem do doente com fígado gordo.
“É uma entidade que nem sempre é diagnosticada. Por isso, é sempre de relembrar a sua importância, pois é uma doença muito presente na nossa sociedade, com grande prevalência nos grupos de doentes que tratamos e associada a outros fatores de risco, como a dislipidemia, a aterosclerose ou a hipertensão arterial.”
Jorge Leitão
O médico disse ainda que é uma doença que tem muitos pontos de contacto com a patologia cardiovascular e com a diabetes, e que nem sempre tem tido a atenção necessária, terminando ao confirmar que a Medicina Interna é a especialidade indicada para se ocupar destes doentes.
“Se há patologia que é claramente do espaço de ação do internista é esta, pois é uma patologia abrangente, que envolve doença em vários órgãos além do fígado, pelo que o internista, com a sua visão global, é importante para o sucesso do tratamento”, concluiu.
(24/05/2019)