Medicina Interna reitera a sua relevância na Urgência e no tratamento integrado do doente crónico
Em mais uma organização conjunta das direções da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI) e do Colégio de Especialidade de Medicina Interna, teve lugar em Tomar uma reunião de diretores e orientadores de formação sobre o tema “Cuidados integrados do doente crónico e papel da Medicina Interna no Serviço de Urgência”.
No evento, que reuniu diretores de serviço de todo o país, João Araújo Correia, presidente da SPMI, destacou o empenho da organização para que este encontro seja um fórum privilegiado de discussão dos problemas da especialidade de Medicina Interna (MI).
O presidente da SPMI destacou ainda o desenvolvimento da MI, sublinhando o paralelo crescimento da SPMI, com cerca de 3000 associados, com o grande dinamismo dos 21 núcleos de estudo e a excelência do Colégio. Ainda assim, o especialista colocou a maior ênfase nos serviços de MI “que são a face reconhecida pela população, da excelente qualidade assistencial dada pelos internistas”.
Sobre os temas em debate, o presidente da SPMI afirmou que o “tratamento integrado do doente crónico permite discutir as eventuais vantagens das ULS para uma comunicação fluida entre a MI e a MGF, como é necessário para que tal seja conseguido”.
“Não há tratamento integrado do doente crónico sem uma colaboração estreita entre o internista e o médico de família. Sem ela o doente continuará a ser atendido de forma reativa na agudizações, na amálgama da urgência, sem a dignidade e qualidade que merece. Depois há que estudar em cada local a resposta mais exequível, porque a melhor pode não ser possível”, destacou João Araújo Correia, avançando ainda que “a nível governamental tem de se perceber que para instaurar estes programas é necessário um quadro de financiamento definido”.
Quanto à Urgência, o presidente dos internistas relembrou que faz parte do programa desta direção a defesa da especialidade no serviço de Urgência (SU) como esteio fundamental do seu funcionamento e garante da segurança dos doentes.
“Sabemos que não é possível melhorar a qualidade de atendimento no SU se não diminuirmos a procura e isso só pode ser conseguido com o comprometimento maior dos cuidados primários com a doença aguda não grave. Não podemos continuar a conformar-nos em que apenas menos de 10% dos recursos ao SU tenham uma observação médica prévia.”
João Araújo Correia, presidente da SPMI
Relativamente à criação de uma nova especialidade, de Urgência, João Araújo Correia mostrou a sua oposição a essa pretensão.
“Sempre defendemos que não deve ser criada a especialidade de Urgência, pelo menos enquanto a nossa realidade for de centenas de doentes no serviço de Urgência sem qualquer triagem e completa mistura de graus de gravidade. Por outro lado, 95% dos doentes internados nos serviços de MI vêm dos serviços de Urgência, o que mostra que os internistas têm de se manter lá para garantir a qualidade do internamento nos nossos serviços”, terminou.
Em representação da direção do Colégio de Especialidade de Medicina Interna, Carlos Monteverde defendeu também o papel central da MI.
“A nossa especialidade tem sido sustentáculo dos serviços de Urgência e, apesar de situações menos adequadas, nunca houve queixas relativamente ao seu trabalho, que no ambiente de urgência é exemplar. Portanto, a pergunta que colocamos é porque é que aparece uma especialidade num serviço que até hoje tem funcionado exemplarmente”, questionou.
O internista manifestou ainda outra preocupação: a possibilidade de com a pretensão de formar uma nova especialidade a MI vir a tornar-se menos atrativa.
“Os internos cada vez mais procuram especialidades que lhe tragam alguns benefícios de qualidade de vida e, ao esvaziar a Medicina Interna da tarefa da Urgência, pode acontecer que ela perca atratividade”, alertou.
“A Medicina Interna é uma porta de entrada da Urgência, onde avaliamos os nossos doentes e fazemos o encaminhamento para o internamento e depois a maioria passa para a consulta externa. Amputar o serviço de Urgência desta porta de entrada seria muito mau em termos de futuro de curto prazo para a MI”, concluiu.
A Reunião foi uma excelente troca de ideias, por muitos colegas diretamente envolvidos nos projetos, com o saber de experiência feito. Carmélia Rodrigues, da ULSAM, demonstrou bem que a existência de uma ULS pode ser facilitadora do tratamento integrado do doente crónico. Oliveira e Silva, Diretor de Serviço do Hospital de Braga, realçou todas as dificuldades do seguimento continuado do doente crónico, comparando a situação atual com a de um “radar”, em que o doente aparece e desaparece do médico, sem deixar rasto. Manuel Viana, da USF de São João – Porto, falou do Síndrome de Fragilidade, como expressão major do envelhecimento e forma terrível como a iliteracia em saúde o promove. Adelaide Belo, Sofia Sobral e Teresa Silva deixaram o extraordinário testemunho da sua Unidade de Tratamento do Doente Crónico Complexo do Litoral Alentejano. Ficou muito clara a ideia de que mais do que a organização, são importantes as pessoas, que fazem nascer coisas novas, que perduram no tempo com o seu entusiasmo. Também se ficou a conhecer o programa implementado para o Doente Crónico Complexo no Hospital São Francisco Xavier, com excelentes resultados, mas que infelizmente foi interrompido.
À tarde, na discussão do Serviço de Urgência, há a registar alguns consensos. Nuno Bernardino Vieira, do NE da Urgência, considerou haver conhecimentos próprios da Medicina de Urgência, que é importante garantir que estão presentes na formação de todos os internistas, para que a sua competência não possa ser posta em causa. Elsa Gaspar, do Colégio de Especialidade de MI, concordou na necessidade da MI se manter no Serviço de Urgência e na recusa da criação da Especialidade de Urgência, mas advertiu para o cansaço e desmotivação dos Internistas quando o seu trabalho é “vulgarizado” no SU. Anabela Oliveira, Diretora do SU do CHLN, considerou o modelo misto das equipas, o que melhor responde ás necessidades, isto é, em que participam nas equipas Internistas dedicados ao SU e Internistas dos Serviços de Medicina, num equilíbrio desejável, dado que 95% dos internamentos provêm da Urgência. Contudo, lembrou que a competência em Urgência é necessária para os internistas que optaram pela Urgência tenham reconhecimento e satisfação profissionais.
(11/11/2019)