Covid-19. Médicos voluntariam-se para esclarecer receios de diabéticos ao telefone
Dezenas de médicos especializados no acompanhamento de diabéticos disponibilizaram-se para ajudar os doentes durante o surto pandémico de covid-19. Criaram uma linha telefónica de atendimento exclusivo para um grupo que deve representar cerca de 10% dos infetados pelo novo coronavírus. Todos os dias, das 8h às 22h, há sempre alguém capacitado para os ouvir, acalmar e aconselhar, num período marcado pela dúvida e pelo medo.
Todos os dias, seis médicos especializados no atendimento a pessoas com diabetes estão disponíveis para responder às dúvidas de quem tem de acumular a doença de base com o surto pandémico de covid-19, através de uma linha telefónica exclusiva (300 003 800). Afinal, a diabetes descompensada pode diminuir as defesas do organismo e proporcionar o desenvolvimento facilitado de infeções. Muitos destes doentes também são idosos, somando mais uma característica de risco e alguns medos, que se acumulam e podem dificultar o dia a dia de isolamento social e afastamento dos hospitais e médicos que os atendem de forma regular.
A linha começou a funcionar a 1 de abril e, ao fim da primeira quinzena de atendimento, os médicos têm recebido entre 100 e 200 chamadas diárias. Quase sempre com preocupações sobre a melhor forma de compatibilizar a necessidade de isolamento social com as exigências de quem sofre de diabetes, como um cuidado apurado com a alimentação e a necessidade de exercício físico. Adequação da medicação, gestão da insulina e até o atendimento um camionista diabético que se encontrava na Suíça foram outras situações que já foram parar à linha de atendimento.
O projeto resultou da vontade de ajudar de cerca de quatro dezenas de médicos com grande experiência no acompanhamento de pessoas com diabetes e foi apoiado pela Sociedade Portuguesa de Endocrinologia, Diabetes e Metabolismo, pelo Núcleo de Diabetes Mellitus da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna e pela Sociedade Portuguesa de Diabetologia.
NÚMERO DE DIABÉTICOS COM COVID-19 PODE SER ESTIMADO EM 1.800
Estima-se que em Portugal exista cerca de um milhão de pessoas com diabetes, um grupo considerado de risco acrescido durante a pandemia de covid-19. Os primeiros números, vindos da China, eram alarmantes, com 20% dos infetados a serem também diabéticos; para além disso, 22% dos internados em Unidades de Cuidados Intensivos sofriam da doença. Os primeiros dados europeus, da Itália, não são tão graves: segundo Estevão Pape, rondam os 10%, “não havendo ainda informação específica sobre Portugal”.
“Se fizermos uma mera extrapolação estatística, se temos cerca de 18 mil infetados por covid-19, podemos estimar atualmente em cerca de 1.800 os diabéticos infetados pelo novo coronavírus”, explica Estevão Pape. Quanto ao objetivo da linha telefónica, em primeiro lugar visou “evitar que estas pessoas se deslocassem aos hospitais por terem deixado a diabetes ficar desequilibrada”, partilha o médico do Hospital Garcia de Orta, em Almada, e um dos voluntários nesta iniciativa.
“As pessoas estão preocupadas com a pandemia, mas ao fim desta primeira quinzena já é possível perceber que a maioria consegue ser médica de si mesma, só precisam de um apoio, de uma almofada. Como a senhora que nos ligou e que não falava com ninguém há um mês”, partilha Estevão Pape, coordenador do Núcleo de Diabetes Mellitus da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna. Mas quanto tempo a linha telefónica vai durar? “Até ser precisa”, garante o médico, que acumula esse voluntariado com a sua atividade normal no SNS e no privado. E uma mensagem que queira deixar aos doentes? “Que se tratem bem, vigiem a glicemia, cumpram as medidas de confinamento da Direção-Geral da Saúde. E usem máscara quando saírem”.
Por Christiana Martins
Artigo Publicado em Expresso
(15/04/2020)