29.º CNMI: A ponte que marca o futuro da Medicina Interna
“Pontes para o Futuro” é o lema do 29.º Congresso Nacional de Medicina Interna, que se irá realizar de 4 a 7 de maio, no Centro de Congressos da Alfândega do Porto. A organização foi atribuída ao Serviço de Medicina Interna do Centro Hospitalar Universitário de São João (CHUSJ) e o presidente da próxima edição, Jorge Almeida, revela os objetivos da iniciativa, salientando a forte procura pela partilha de conhecimentos e discussão científica, contribuindo para a “visão mais alargada, moderna e integrada da especialidade de Medicina Interna”. A promessa de inovar é ainda sublinhada pelo responsável, que encara o projeto como “desafiante e prestigiante”, sem deixar de reforçar o evidente entusiasmo e dedicação dos envolvidos no processo organizativo.
Será a 29.ª edição do Congresso Nacional de Medicina Interna. Qual considera ser a inovação que marca este ano?
Jorge Almeida (JA) – Sendo esta a reunião magna de todos os Internistas, a inovação que existe é garantida pela própria reunião, através da discussão e partilha de conhecimento que este tipo de eventos, necessariamente, gera. Sendo a primeira vez que o Serviço de Medicina Interna do Centro Hospitalar e Universitário de S. João (CHUSJ), enquanto tal, lidera a organização, tal representa um desafio enorme para a organização, mas é simultaneamente uma garantia de inovação e de programação científica. O facto de se realizar na belíssima cidade do Porto vai proporcionar, certamente, uma outra visão do Congresso Nacional, integrado no dia a dia de uma cidade que cada vez aposta mais na fixação de grandes eventos científicos. Temos uma nova e inovadora perspetiva em várias dimensões. O próprio lema do congresso – Pontes para o Futuro – já o indicia, bem como a mensagem que a comissão organizadora divulgou para justificar esta escolha. Do ponto de vista da estrutura do congresso, privilegiaremos a discussão aberta nas sessões organizadas (com a diversidade necessária – encontros com especialista, sessões de prós e contras, hot topics, estado da arte, mesas redondas, simpósios, introdução de novos modelos, tais como, a viagem com especialista e a valorização das apresentações orais com palestras, em alguns dos temas propostos, lideradas por especialistas na área, a anteceder as clássicas apresentações, entre outras inovações que guardaremos para divulgação no início do congresso) e a valorização das temáticas, no âmbito da Medicina Interna, que, recentemente, estiveram em foco e em discussão. Apresentaremos alterações, em relação a eventos prévios, no que respeita à programação científica do primeiro dia e do dia de encerramento do congresso… entre outras alterações que divulgaremos, também no programa social, é sempre possível inovar e fazer diferente.
O Dr. Jorge Almeida integra a presidência da comissão organizadora do evento. Que outros nomes estão por trás da coordenação deste encontro nacional e como tem sido o processo?
JA – A organização do Congresso Nacional de Medicina Interna foi atribuída ao serviço de Medicina Interna do CHUSJ. Esta tarefa, desafiante e prestigiante, é um desafio e ao mesmo tempo um orgulho para um Serviço de prestígio reconhecido, que se afirmou e diferenciou ao longo de décadas, construído por personalidades indiscutíveis na afirmação da Medicina Interna portuguesa. Na construção deste projeto, convidámos para colaborarem na organização deste evento, os outros três hospitais da região do grande Porto, num espírito aberto e colaborativo que entendemos como fundamentais. Assim, a secretária-geral será a Dr.ª Luísa Fonseca, a tesoureira será a Dr.ª Maria João Lima e os restantes membros da comissão organizadora são: Prof.ª Joana Pimenta, Dr. Vasco Barreto, Dr.ª Inês Furtado, Prof. Fernando Friões, Dr.ª Paula Dias, Dr.ª Filipa Gomes, Dr.ª Ana Ribeiro, Prof.ª Patrícia Lourenço, Dr.ª Edite Pereira, Dr.ª Marta Soares e Dr. Pedro Ribeirinho Soares. Contamos ainda com a colaboração, envolvimento e disponibilidade de todos os clínicos do serviço de Medicina Interna do CHUSJ. O processo, como esperado, conta com o entusiasmo e a dedicação de todos os envolvidos, promovendo-se a partilha de opiniões e as visões diversas, gerando uma discussão científica aberta e necessária para os objetivos traçados. Esta é a garantia de um programa científico de excelência, que nos propomos atingir.
Que objetivos foram traçados para esta edição?
JA – Reforço a partilha de conhecimentos, a discussão científica aberta a temas originais e de interesse reconhecido, a troca de opiniões em temas comuns mas ainda não fechados e que nos interessam bastante, como especialidade e atores da saúde, o desenvolvimento e a delineação de projetos científicos, o encontro entre gerações e uma ocasião para o contacto privilegiado e colaborativo entre todos os parceiros fundamentais na prática e na modernização dos cuidados de saúde (profissionais de saúde, indústria farmacêutica e de equipamentos e de tecnologia aplicada na saúde). Temos ainda como objetivo o estabelecimento de pontes e sinergias com as especialidades médicas, com particular destaque para a Medicina Geral e Familiar.
Pode revelar-nos quais serão os hot topics?
JA – Como é fácil perceber, numa especialidade com a abrangência que a Medicina Interna tem e desenvolve, não há área da Medicina que nos seja alheia. Assim, contando com o auxílio inestimável dos diversos núcleos de estudo da SPMI, tentamos privilegiar os temas mais controversos do ano e o modelo de apresentação mais adaptado aos tempos atuais. Obviamente, não conseguiremos esgotar todos os temas propostos, apesar dos modelos inovadores que propomos.
Na sua perspetiva, o que diferencia a Medicina Interna das restantes especialidades?
JA – A Medicina Interna é uma especialidade com competências em todas as áreas da Medicina, com um campo de ação que se desenvolve em todos os cenários assistenciais, desde o doente grave no serviço de urgência, na enfermaria ou em unidades de cuidados diferenciados, até à hospitalização domiciliária e ao ambulatório. A essas competências fundamentais e fundacionais, que sempre constituíram o core da nossa especialidade e já nos distinguiam de todas as restantes, o Internista moderno adquiriu, desenvolve e pratica, atividades diferenciadas em áreas específicas da Medicina que o tornam uma referência em diversos contextos, a par das restantes especialidades dedicadas a órgãos específicos. Esta ponte entre o carácter generalista com as competências transversais que, necessariamente, a nossa formação e atividade garantem, e a diferenciação em áreas específicas que agora desenvolvemos e praticamos, foi aliás o lema, que esta comissão organizadora determinou para o 29.º CNMI.
E os maiores desafios sentidos no contexto nacional? Que intervenções julga ser necessário fazer?
JA – A diferenciação em áreas específicas, sem perder as competências transversais que necessariamente adquirimos torna-nos a especialidade basilar e determinante do Sistema Nacional de Saúde a nível hospitalar. Essas competências ficaram bem demonstradas na resposta nacional à recente pandemia por SARS-CoV-2, onde foi reconhecido o nosso contributo determinante. É notório que, apesar da capacidade, competência e indispensabilidade reconhecidas à nossa especialidade, existe um claro défice de Internistas em todos os serviços hospitalares, relativamente à dotação prevista para o funcionamento dos serviços e que, com o desenvolvimento de áreas de atuação específica, dispersaram os parcos recursos existentes. Foram os modelos organizacionais, recentemente criados, com o êxodo de Internistas (objetivamente os especialistas mais bem preparados e com as competências adequadas) para os Serviços de Cuidados Intensivos, para as Unidades de Cuidados Paliativos, Unidades de Cuidados Diferenciados no âmbito do doente agudo, para as Unidades de Cuidados Domiciliários e para tarefas organizacionais no âmbito hospitalar. O desenvolvimento de estruturas hospitalares privadas, evoluindo para uma estrutura clássica hospitalar com o desenvolvimento de verdadeiros serviços, onde o Internista é garante de assistência clínica de qualidade, associados a uma política pública de ausência e de recusa de contratação de profissionais, inseridos num contexto demográfico desfavorável e que se agravará nos próximos anos, com um número enorme de aposentações que conduzirão, certamente, ao agravamento da situação atual. Outros fatores foram também preponderantes na organização de cuidados de saúde e na dinâmica dos serviços, tal como a lei do descanso compensatório obrigatório. Estes fatores têm sido sucessivamente debatidos, mas nesta fase urge a imediata criação de condições estruturais e financeiras para a fixação de Internistas nos serviços de Medicina Interna; a dotação e o dimensionamento real dos quadros de Internistas dos Serviços de Medicina Interna; a definição de áreas específicas de atuação e o desenvolvimento da atividade clínica em áreas específicas que entretanto adquirimos; a revisão do plano de formação da especialidade de Medicina Interna e também a sinergia entre os diversos serviços de Medicina Interna. Estas e uma série de outras medidas, das quais elenco a necessidade de adaptação da capacidade hospitalar com um aumento de camas, notória em quase todos os hospitais, em face do envelhecimento e da complexidade dos doentes, onde a doença crónica e a condição social criaram a necessidade do redimensionamento da lotação dos serviços, serão determinantes para o futuro imediato. Temos observado diariamente e é dramatizado em todos os noticiários, o problema unicamente focalizado na resposta momentânea e sazonal dos vários serviços de urgência, em face dos expectáveis picos de afluência. Como explicitado e sem querer ou sequer almejar neste momento aprofundar este tópico, estas são algumas intervenções, entre outras, que importa empreender.
Em que sentido o 29.º Congresso Nacional de Medicina Interna pode contribuir para a resolução destes problemas?
JA – O momento de partilha que este evento proporciona, permite a interação entre profissionais de todo o País, a troca de experiências e o diagnóstico deste tipo de situações. Este é um problema transversal a todos os serviços hospitalares e que a todos interessa. A SPMI, o Colégio da Ordem dos Médicos da especialidade de Medicina Interna e diretores de serviço de Medicina Interna e todos os Internistas e futuros Internistas estão cientes das dificuldades sentidas e do caminho a percorrer. Este é também o local de eleição para em conjunto serem tomadas e elencadas medidas estruturais e de sensibilização das entidades competentes.
Ponderando no seu envolvimento na organização do evento, que expectativas esboça para o encontro?
JA – Como presidente do congresso, sou a face mais visível da organização, mas, seguramente, sou mais um elemento com responsabilidades idênticas às dos restantes. Tenho a certeza da excelência da programação científica que o congresso terá, fruto do empenho dos elementos da comissão organizadora e do envolvimento de todos os serviços de Medicina Interna dos hospitais do grande Porto. A região Norte e a cidade do Porto, com a sua hospitalidade e tradição liberal é o local ideal para este congresso que se pretende aberto a todas as discussões e controvérsias e do qual, seguramente, resultará uma visão mais alargada, moderna e integrada da especialidade de Medicina Interna. Estas são as nossas expectativas.
(15/12/2022)
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